A palavra do momento…

Saudade

Se eu fosse uma palavra, hoje, eu seria a saudade. É a palavra da vez, a que eu mais tenho usado no meu vocabulário e a que mais tenho escutado também. Se alguém me visse distraída e perguntasse no que estou pensando, eu diria que estou apenas sentindo… sentindo saudade, e é ela quem está me levando para longe e me deixando com esse olhar distante…

Ela tem me feito viajar mais do que as minhas pernas, que – felizmente – têm me feito viajar bastante ultimamente. Mas a saudade está sempre muito à frente das minhas pernas, por mais agitadas e velozes que elas sejam.

A saudade que eu trago comigo é forte e potente, coloca a Ferrari do Schumacher no chinelo, e aposto que, muitas vezes, ela é mais veloz do que a luz. Além de tudo, é onipresente, afinal, eu sinto saudade de tanta coisa e de tanta gente constantemente que só sendo onipresente para dar conta de tudo.

Saudade da gargalhada de um amigo, do jeito de falar de outro, do carinho e doçura de alguns, da falta de noção e juízo de outros, do jeito engraçado, da espontaneidade, do jeito de ver e viver a vida…

Saudade do olhar carente e pidão do meu cachorro. Saudade de um lugar… não, na verdade, de vários. Saudade de cheiros, do cheiro da casa da minha mãe, do cheiro dela, e das covinhas que ela revela toda vez que sorri, e que eu morro de raiva por não ter herdado. Saudade de sons, sabores, cores. E, incrivelmente, não há nostalgia desta vez. Ela não tem me visitado nos últimos tempos, não fico relembrando momentos, nem fases, nem remexendo o passado, vendo fotos de algum lugar distante, nem abrindo as gavetas que têm o cheiro da minha história entranhado em cada peça de roupa minha.

Também não tenho aberto a minha caixinha mágica de recordações. Eu a considero mágica porque ela é, de certa forma, uma máquina do tempo que me leva diretamente ao passado, mas, somente ao passado de momentos felizes, emocionantes, únicos… mágicos! E, apesar de me acompanhar há tantos anos, e ser muito antiga, a minha caixinha é o que eu tenho de mais moderno, e supera qualquer invenção tecnológica.

A nostalgia é uma velha companheira minha, a maior parte do tempo convivemos harmoniosamente, mas nem sempre é assim. Confesso que ela me atrapalha, às vezes. A verdade é que ela é acomodada e espaçosa, chega, se instala, é bem tratada, e quer ficar, tomando todo o meu tempo, e me impedindo de viver o presente. Por isso, precisamos tirar férias uma da outra, de vez em quando. Igualzinho a qualquer relacionamento humano que se desgasta naturalmente.

Já a saudade nunca vai embora, apenas se distancia e se aquieta quando se satisfaz, mas com o apetite que tem, não demora muito e ela começa a se fazer presente de novo. Chega como quem não quer nada, porque sabe que chegou – como sempre – cedo demais. Faz o tipo que acha que pontualidade apenas não basta, e prefere estar sempre adiantada para garantir o melhor lugar aonde quer que vá.

Quando chega, vem de mansinho, mostra a cara, mas fica de longe, não me toca e nem fala nada, e quando eu me dou conta, ela já está me rodeando, me aborrecendo, reclamando o tempo inteiro, me perseguindo, e quando eu tento ignorá-la, ela piora ainda mais. Me catuca no ombro, põe as mãos na cintura, franze a testa, me olha aborrecida e fala – “Ei, eu tô aqui óh… você não vai fazer nada, não? Esqueceu que eu existo para poder morrer? E você sabe que morrer, para mim, é um prazer enorme, e eu fico uma fera quando isso não acontece. Exijo que você me proporcione esse prazer e tem que ser agora!”. Ainda por cima é mimada e arrogante.

Ela começa a me ferir quando eu não faço o que ela manda, não que eu não queira fazer, mas eu não posso, não consigo ser tão veloz como ela, especialmente quando estou vivendo a tantos quilômetros de distância de tantos dos meus amores. Mas ela não entende, nem tenta. Me castiga, começa as sessões de tortura, e faz o meu coração doer de uma forma que só ela consegue fazer.

Estou decidida a dar um basta nisso, e ela sabe que eu vou, por isso começa a ter um pouco de piedade de mim, mas só um pouco. Agora me perturba como eu perturbava meus pais toda vez que viajávamos, perguntando de cinco em cinco minutos – “Estamos chegando? Falta muito ainda?”

Como se não bastasse a saudade grudada em mim 24h por dia, me torturando, ela ainda convida a amiga ansiedade – outra torturadora profissional – para passar um tempo conosco. Agora sim o serviço ficou completo.

Mas falta pouco para tudo isso acabar, pelo menos, desta vez.

Roberta Simoni