Do que você (não) sabe.

Eu não sei o que você pensa a meu respeito – se é que o fazes – mas quase acho graça quando fala que me conhece muito bem.

Você não sabe que tenho sonhos em preto e branco, e que conjugo o tempo pelo que sou quando estou dormindo e acordada.

Não sabe que nesses sonhos descoloridos há música francesa tocando no rádio e que eu não só consigo entender as letras, como sei cantar todas as canções.

Não imagina que o rádio dos meus sonhos só toca as músicas que gosto, e quando não há nada de bom tocando em nenhuma estação, o rádio se cala. E assim permanece por longos intervalos.

Já pensou como seria bom se eu fosse como esse rádio? Se tudo que eu falasse soasse como música aos seus ouvidos e se eu só falasse quando fosse para te dizer o que você gosta de ouvir?

É claro que já pensou, que já teve vontade de me calar a boca, o impulso de interromper bruscamente meus pensamentos tortos de tão certos a seu respeito, mas aposto que se viu recriando as minhas frases tolas na sua cabeça uma centena de vezes antes de dormir.

E você nem sabe dos julgamentos que faço intimamente, nem mesmo de ti, pois pensa que eu já te disse tudo, com esse meu péssimo hábito de dar voz a tudo que me passa pela cabeça, tantas vezes sem antes passar pelas vias do coração. Mas estou guardando o melhor pro final.

Você não notou que eu sou outra a cada dia. Você poderia ter se apaixonado por várias “mins”, mas só gostou de uma ou outra que se deu ao trabalho de conhecer. Poderia ter se deitado com várias mulheres e ter feito planos diferentes com cada uma delas. Você nunca teria se entediado se tivesse notado…

Quem me diria hermética? Qualquer estranho, mas não você, afinal, conhece-me como a palma dessa tua mão bonita que você nunca parou para observar direito.

Julga minha transparência como leitura fácil, mas não passou do primeiro parágrafo.

Roberta Simoni

25 comentários sobre “Do que você (não) sabe.

  1. Se eu fosse esse cara, preferiria continuar sem saber nada sobre essa mulher.
    Continuaria no primeiro parágrafo de sua transparência. Ou na primeira estrofe de sua poesia (no máximo!).
    Hermética, diferente, muitas em uma… não importa.
    O melhor, muitas vezes, é não saber.

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      • Porque prefiro curtir a analisar. Prefiro viver sem julgar. Parece bobo, eu sei. E perde-se algo. Mas não é o mesmo que não prestar atenção. A poesia da sua personagem é perfeita, ignorando outras possibilidades sob o ponto de vista do cara. Talvez ele perceba, meio sem querer, tudo o que ela é. E até o que ela não saiba que é (para ele). São muitos significados, entendeu? Aff… tô metido a psicólogo hoje.
        Tá vendo: não importa. Basicamente, o melhor é curtir o amor sem análises profundas ou muitos questionamentos.

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  2. Caracaaas!
    Seus textos são maravilhosos!
    Eu me vejo em muitos deles e, quando os leio, me sinto mais acompanhada e menos estranha nesse mundo.

    Parabéns!
    Obrigada pela beleza de suas palavras!

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  3. Se o objetivo era fazer alguém desistir, não funcionou. Lindo texto, mas eu, por exemplo, me apaixonei ainda mais.

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  4. Conversei com uma amiga ainda hj de manhã… ela me disse que mulher tem mania de querer se mostrar inteira, mas que não devia fazer isso nem para o próprio marido! Completou dizendo que ouviu do digníssimo, com quem está casada há anos, a seguinte frase: “eu nunca sei o que você está pensando de verdade, se diz que sou lindo não sei se vc é sincera ou irônica, mas deixa pra lá!”.

    Entendeu? “Deixa pra lá”! Eles não estão interessados no que se aprofunda… o raso parece ser mais interessante, dá menos trabalho. São poucos os que mergulham.

    No mais, pra variar, vc arrasou…
    Bjo, minha amiga linda feita de oceanos infindáveis!

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  5. primeira vez que passo por aqui e amei!

    concordo plenamente com cada palavra… às vezes nos aborrecemos com os homens (não os nossos, que se falassem isso não seriam mais nossos… hehehe) e sua mania machista de dizer que não dá pra comer o mesmo prato toda noite, o interessante é variar o cardápio e o restaurante.

    felizes somos nós, que sabemos ser menus diferentes todas as noites, cheias de delícias e com sobremesas fantásticas. 😉

    eles que continuem nas procuras vazias… enquanto isso, a gente varia as refeições de quem nos merece. 😉

    parabéns pelo texto e um beijo! vou passar mais vezes!

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  6. Amei, amiga… Ficaria MAIS LINDO AINDA na interpretação de Elisa Lucinda. E não sei o que me faz achar que ela gostaria, caso o conhecesse. Faz chegar até ela???? beijos, te amo!

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  7. Roberta, seus textos são incríveis! Esse particularmente me encantou.
    Passo por aqui escondidinha, no geral não deixo rastro, mas esse eu tinha que comentar. É bonito ver como algumas pessoas entendem quão infinitamente diversa é a alma de um ser.
    Amei demais! Um dia eu chego lá!
    Suceeessooo pra você!

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  8. “Eu não sei o que você pensa a meu respeito – se é que o fazes – mas quase acho graça quando fala que me conhece muito bem.
    Julga minha transparência como leitura fácil, mas não passou do primeiro parágrafo.”

    ISSO É uma música pronta! 🙂
    Um dos meus textos preferidos até agora.

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