Sobre amores e temores

Agora talvez eu seja mais temor, mas, por tanto tempo fui só amor. Amor purinho, da melhor qualidade. E morria de dó dos meus amigos que tiveram o coração partido e não conseguiam juntar seus cacos. E não entendia porque os casais se destruiam enquanto tentavam construir um relacionamento, uma vida juntos, uma casa com um quarto a mais para as crianças e um quintal grande para os cachorros. No lugar de levantar paredes de tijolos, montavam um castelo de areia, que a cada vento mais forte que batia, desmoronava.

Eu já construí os meus castelos de areia por aí. Mas a gente nunca vê isso com clareza na hora da construção, ou até percebe, mas ignora, finje que os grãos de areia são tijolos e toca com a obra, até o dia do primeiro vendaval tornar a falta de tijolos gritante!

Por dois ou três relacionamentos seguidos eu me surpreendi com a minha capacidade de colar os pedaços partidos do meu coração e mantê-lo lá, aberto, ainda que fragilizado, exposto para amar de novo. Só que, com tanta exposição, eu peguei uma bactéria perigosa chamada medo.

Mas, não se preocupem, tem cura. De medo eu não morro! Só que essa bactéria causa um tipo de reação ao organismo que, se não houver um tratamento adequado, de hospedeira em “corpo estranho”, ela passa a ser moradora fixa, com contrato de locação e tudo. O processo de cura é lento e demorado, mas quase sempre eficaz.

Enquanto sigo com meu tratamento, observo meus amigos (na maioria homens), verdadeiros românticos – felizmente – incorrigíveis e fico tão orgulhosa deles. Não sei se é influência do Dia Internacional da Mulher que está me deixando deveras sensível, se são meus hormônios, se é a quantidade de filmes românticos que tenho visto ou o excesso de romances que tenho lido, só sei que essa fase “temor” não está combinando nada com o universo romântico ao meu redor hoje.

“Eu não sei viver sem amor”, foram as palavras que o meu amigo usou ao me relatar sua história de amor com uma moça que vive em outro continente. “Beta, você é como eu, precisa de paixão, de bilhetinhos românticos, de cartas de amor, tenho certeza que vai me entender…” afirmou um outro amigo ao me mostrar a carta de amor que fez para a nova namorada. Muitas mulheres dariam a vida para receber uma carta daquelas, e qualquer mulher que lesse aquilo, se derreteria. Comigo, é claro, não foi diferente. Desgraçado! Me fez chorar… e de soluçar!

Tinha um vendedor ambulante no centro da cidade ainda agora rodeado por tanta gente que pensei: “Opa, deve tá vendendo 3 bombons Serenata de Amor por R$1,00, também quero!” . Só quando cheguei perto é que vi que o moço estava vendendo rosas avulsas, cercado exclusivamente por homens. Que lindo !!!

Na avenida Rio Branco estava rolando uma passeata, homens e mulheres protestavam pelos direitos das mulheres. No metrô o vagão estava cheio de moças carregando flores nos braços. Bravo, bravo! Senti vontade de bater palminhas empolgadas de “tiazinha”, e dar saltos de alegria feito criança pequena! Lindo, lindo, lindo!

Aí eu abro a porta de casa e vejo um envelope. De repente me senti num filme… sabe aquelas comédias românticas onde o amor sempre vem, mesmo que chegue pelo correio? Então… mas era só a fatura do meu cartão de crédito que, como de costume, me deixou tensa. “Good bye love, welcome fear!” Medo, muito medo ao abrir o envelope e ver o resultado de um dia de fúria (leia-se TPM), sanado provisoriamente com a compra de um scarpin. Eu disse provisoriamente! Eis que sempre chega o momento fatídico de efetuar o pagamento.

Mas nem a fatura de cartão de crédito mais cara quebraria o encanto do dia de hoje. Nem mesmo o meu pensamento sujo de que seria muito bom se eu tivesse um homem que bancasse as minhas contas, como acontecia antes da minha avó ter queimado aquele maldito sutiã em praça pública!

Eu sigo acreditanto no amor, continuo chorando nos casamentos das minhas amigas, me emocionando com cartas de amor, chorando de boca aberta com filmes e romances de banca de jornal, achando liiiindo de viver constatar que os homens românticos estão se proliferando e, acima de tudo, feliz por ver tanta gente com o coração aberto para amar, mas agora eu preciso pensar num jeito de conseguir mais trabalho para pagar o meu scarpin. Urgente!

Outros scarpins me esperam, e ainda me resta amor… muuuuito amor!

Roberta Simoni